(artigo inspirado no texto provisório do liturgista Pe. Danilo César dos Santos Lima)
A Igreja é sacramento da íntima união com Deus e da unidade de todo o gênero humano. É o Reino de Cristo, que já presente em mistério, se expande por todo o mundo pelo poder de Deus. Esta, “enriquecida com os dons do seu fundador e guardando fielmente os seus preceitos de caridade, de humildade e de abnegação, recebe a missão de anunciar e instaurar o Reino de Cristo e de Deus em todos os povos e constitui o germe e o princípio deste mesmo Reino na terra” (LG, 1-3-5).
Após a ressurreição, Cristo entregou a Igreja a Pedro, para que ele apascentasse o seu rebanho (Jo. 21,17), confiando a ele e aos demais apóstolos a sua difusão e governo (cfr. Mt. 28,18 ss). Esta é a Igreja una, santa, católica, apostólica e ministerial, governada pelo sucessor de Pedro e pelos Bispos, que juntamente com os que se voltam com fé para Cristo constituem a sua Igreja (LG, 8-9).
Ao constituir a Igreja, Cristo fez do povo um “reino sacerdotal para seu Deus e Pai” (Apor. 1,6; cfr. 5, 9-10). Há de se falar, deste modo, de um sacerdócio comum a todos os batizados, o sacerdócio régio, e um sacerdócio ministerial, concedido pelo sacramento da ordem. O único sacerdócio absoluto é o sacerdócio de Cristo, participamos deste, contudo, pelo batismo ou pelo ministério ordenado, de modo que, eles ordenam-se mutuamente um ao outro.
“Pelo sacramento da Ordem, a Igreja é governada e multiplicada espiritualmente” (DS 1311). O sacerdote é ministro de diversos sacramentos e recebe a autoridade para realizar o sacrifício eucarístico, conforme uma conhecida fórmula, in persona Christi, in persona Ecclesiae (na pessoa de Cristo, na pessoa da Igreja).
O povo de Deus, os fiéis, em virtude do seu sacerdócio régio (concedido pelo sacramento do batismo), concorrem na oblação da Eucaristia (LG, 10). Deste modo, pode-se dizer que “existe uma outra porção sacerdotal do povo de Deus, que não aquela ministerial, que concorre, isto é, caminha junto, na ação litúrgica”. O jesuíta italiano Cesare Giraudo afirma que a atuação dos fiéis não é unicamente assistir, mas de agir juntamente com os ministros ordenados. A Constituição sobre a Sagrada Liturgia também afirma:
A Igreja procura que os cristãos não entrem neste mistério de fé como estranhos ou espectadores mudos, mas participem na ação sagrada, consciente, ativa e piedosamente, por meio duma boa compreensão dos ritos e orações; sejam instruídos pela palavra de Deus; alimentem-se à mesa do Corpo do Senhor; dêem graças a Deus; aprendam a oferecer-se a si mesmos, ao oferecer juntamente com o sacerdote, que não só pelas mãos dele, a hóstia imaculada; que, dia após dia, por Cristo mediador, progridam na unidade com Deus e entre si, para que finalmente Deus seja tudo em todos.
A Sacrosanctum Concilium (SC) permite afirmar a “presença real de Cristo, além das espécies sagradas e demais sinais, nas ações ministeriais da Igreja, não somente dos ordenados. Os leitores, salmistas, cantores e demais pessoas que prestam algum serviço também são presença real de Cristo. Temos, por certo, uma equivalência. O Concílio Vaticano II, através da SC, abre a perspectiva, sem dizer explicitamente, mas afirmado organicamente que os leigos também agem in persona Christi. Essa equivalência decorre do batismo que nos enxertou em Cristo”. Segundo a Instrução Geral da Liturgia das Horas, tudo o que pertence ao Cristo cabeça emana para o corpo eclesial (Igreja). Essa perspectiva da fórmula in persona Christi levanta muitos questionamentos que nos levam a refletir, sem, contudo, deixar de afirmar as doutrinas acerca do ministério ordenado.
A partir dessa reflexão, de que todos os cristãos são chamados a participar ativamente da missão da Igreja, é que, após o Concílio Vaticano II, a Igreja opta por abrir as portas à participação dos leigos na liturgia, admitindo sua atuação nos serviços e ministérios.
Siglas
DS - A sigla DS corresponde a: Denzinger, H.; Schönmetzer, A. (org.) Enchiridion Symbolorum, Definitionum et Declarationum de rebus fidei et morum (P. Hünermann, ed.). Bolonha: EDB, 1995.
LG – Constituição Dogmática sobre a Igreja Lumen Gentium
SC – Constituição Conciliar sobre a Sagrada Liturgia Sacrosanctum Concilium
Referências complementares
GIRAUDO, Cesare. “In persona Christi” – “In persona Ecclesiae”: Fórmulas eucarísticas à luz da “Lex Orandi”. Em: Perspectiva Teológica, Belo Horizonte, v. 42, maio./ago. 2010.
Oficinas de práticas litúrgica 1: A questão ministerial na Igreja – texto provisório do liturgista Pe. Danilo César dos Santos Lima, padre diocesano da Arquidiocese de Belo Horizonte.