No dia 15 de julho de 2015, chegava à paróquia Sagrado Coração de Jesus, num misto de apreensão e confiança. Apreensão por assumir uma paróquia na cidade, onde estudei por 12 anos, nos seminários Menor e Maior. Confiança, porque é o Sagrado Coração de Jesus, que acolhe nossas dores, angústias, tristezas, preocupações, mas também, expectativas, alegrias, sonhos e esperanças. Uma paróquia ainda nova, formada no espirito inicial como rede de comunidades, cujas sementes lançadas pelos párocos anteriores e vigários paroquiais, ligados à equipe de formadores dos novos presbíteros, encontraram cristãos leigos(as) dispostos(as) a abraçar uma nova realidade, ligada anteriormente à tricentenária paróquia da Sé.
Os primeiros meses são de adaptação para quem chega e para quem acolhe. Vem o estouro da barragem do Fundão. Para as mineradoras, um acidente, um evento. Para o Ministério Público, Igreja, Arquidiocese de Mariana, Movimentos Populares, Pastorais Sociais, pessoas conscientes, sensíveis à dor humana e, principalmente, para os(as) atingidos(as), um crime socioambiental de proporções incalculáveis, que ceifou vidas humanas e, passados quase cinco anos, ainda longe de vermos atendidas as necessidades básicas de moradia decente, trabalho digno, saúde física, psíquica e espiritual, sem contar as profundas mudanças em todas as áreas e dimensões vitais.
A administração econômica, com pendências jurídicas no patrimônio material; a ação pastoral e evangelizadora com lideranças, agentes de pastorais e movimentos, comprometidos com as prioridades das assembleias diocesana, regional e paroquial. Cabia-nos dar continuidade e melhorar o que fosse possível para que todos(as) pudessem participar dos grupos de reflexão, pastorais sociais, dimensão sociopolítica (na paróquia com o nome de sociotransformadora), grito dos excluídos, romarias, Fóruns Sociais pela Vida e outras iniciativas, no esforço de ligar a Fé celebrada com a Vida sofrida e explorada, que precisa ser sempre defendida e promovida.
Prestes a completar cinco anos de caminhada, neste tempo tão diferente dos outros, devido ao coronavírus e à pandemia gerada pelo mesmo, vi-me desafiado a começar a mudança por mim mesmo, renovando a cada dia o sim ao chamado de Deus, no ministério ordenado, abraçado há trinta e cinco anos. Em conversa com dom Airton e partilha com alguns irmãos no presbitério, ele acolheu o pedido para que me desligasse da paróquia Sagrado Coração de Jesus, para, durante um certo tempo, dedicar-me ao fortalecimento da espiritualidade, continuando a celebrar diariamente a Eucaristia, rezar a liturgia das horas e estar mais próximo de outras realidades, que, na função paroquial administrativa ficaria mais difícil. Assim sendo, celebrando a última missa on line, no dia 28/6/2020, Solenidade de São Pedro e São Paulo, enquanto responsável pela paróquia, consagro mais uma vez ao Sagrado Coração de Jesus toda a paróquia, que ficará interinamente sob a responsabilidade do vigário paroquial pe. Enzo dos Santos.
A primeira palavra, então é de GRATIDÃO. Gratidão a Deus por tantas graças e bênçãos, que me julgou fiel para o seu serviço e ao qual procuro elevar sempre o cálice da salvação, não apenas pessoal mas para todo o seu povo amado. Gratidão aos irmãos no presbitério, ligados a essa paróquia, que não medem esforços para colaborar nas celebrações e outras demandas, quando é possível. Gratidão aos diáconos permanentes, Robson e Vicente, pela disponibilidade em viver com o amor a diaconia no tríplice serviço da palavra, culto e caridade. Gratidão aos irmãos(ãs) das dezesseis comunidades, presentes nas pastorais, dimensões, movimentos e ministérios. Muito obrigado mesmo, de coração, pela acolhida, empenho e dedicação, colocando os dons a serviço de todos(as). Aprendi muito com vocês e levo comigo gratas recordações. Peço-lhes perdão pelas falhas e cobranças, muitas vezes exigentes, mas que visam o melhor crescimento do reino de Deus. Gratidão a dom Aírton, que acolheu o pedido de renúncia (termo canônico) à paróquia e se colocou à disposição para que a arquidiocese não deixe os padres desamparados em quaisquer circunstâncias.
A segunda palavra é CONFIANÇA. Confiança em Deus, uno e trino, cujo amor transborda num coração, manso, humilde e cheio de misericórdia. Confiança no arcebispo e no presbitério de Mariana que, com desafios, procura viver a comunhão presbiteral nos vários aspectos. Confiança nos cristãos leigos(as) e agentes, que neste tempo de pandemia têm sido tão criativos, reinventando o melhor jeito de evangelizar pelas redes sociais, cuidado mútuo em casa e nos outros ambientes.
A terceira palavra é MISSÃO. Ninguém está neste mundo por acaso. Todos temos uma missão. Quando esta é desempenhada por amor Àquele que a confia e oferece a graça para bem desempenhá-la, não importa o lugar, as pessoas, as circunstâncias. Tudo se torna dom de Deus. Continuemos desempenhando bem nossa missão. O Senhor está do nosso lado para nos acompanhar, dentro de nós para nos sustentar, atrás para nos proteger, à frente para nos conduzir e acima para nos abençoar. Nossa Senhora, mãe Santíssima, ornada de inúmeros títulos e virtudes, tem no coração todos os seus filhos e filhas.
A todos(as) desta querida paróquia trago- os no coração e os consagro ao Sagrado Coração de Jesus. Em todas as missas, continuaremos a estar bem próximos e em comunhão. Recebam as bênçãos copiosas de Deus. Abração carinhoso!
Pe Geraldo Barbosa