Um dos professores que tive, entre os vários que a vida me apresentou, deu um testemunho que nunca mais saiu de meu coração. Sacerdote, ele trabalhava, em São Paulo, numa espécie de orfanato que acolhia crianças órfãs ou que tinham sido separadas de seus progenitores por causa de abusos e violências. Sempre muito emocionado ao falar de seu envolvimento com as crianças, do drama que elas passaram e de como era difícil o trabalho de recuperação delas, compartilhou conosco uma percepção que foi tendo à medida que os acompanhamentos aconteciam: o olhar de uma criança órfã é carregado de uma tristeza inexplicável! Mesmo conseguindo brincar, o olhar é sempre o mesmo: triste e melancólico. Denunciador do afeto primário que havia lhe sido roubado: os cuidados de um pai e de uma mãe!
Tenho por mim que Deus sempre se ocupou em fazer-nos compreender que seu amor é a garantia de todo cuidado e de todo afeto fundamentais de que necessitamos para sermos o que devemos ser: seus filhos amados; homens e mulheres realizados. Foi assim no tempo da promessa, suscitando no coração dos seres humanos a livre decisão pela fidelidade; foi assim na plenitude dos tempos, revelando-se nas palavras e ações benditas de Jesus e também continua sendo no assim chamado últimos tempos, tempo do Espírito, tempo da Igreja, no qual somos todos incorporados a Cristo. Em todo tempo... os cuidados de um Pai... de uma Mãe
Tanto assim que tendo vencido o tempo de estar neste mundo, e indicando aos seus discípulos a necessidade de voltar para junto do Pai, Jesus anuncia a vinda de um outro Paráclito (Jo 14,16). Mas a fim de que os discípulos compreendessem que não se tratava de uma despedida, mas de um novo tempo de recomeço, de uma presença ainda mais íntima e revigorante, proferiu esta palavra: “Não vos deixarei órfãos, eu virei a vós!” (Jo 14,17). Falando em nome do Pai (não vos deixarei órfãos) anuncia sua presença no Espírito (eu virei a vós) confirmando que quem o ama, ama o Pai e eles, o Pai e o Filho, virão e estabelecerão em nós, pelo Espírito, sua morada (Jo 14,23). E nos confirmou que o Espírito nos fará compreender todas as coisas e tudo o que Jesus nos disse! (Jo 14,26). E entre todas essas coisas um de nossos maiores legados espirituais: não somos órfãos; não vivemos a esmo; não nos faltam cuidado, amor e afeto primordiais.
Quando Deus, em seu amor por nós, profetizou-nos um novo espírito e um novo coração (Ezequiel 36, 26), referia-se a dar para cada um de nós a capacidade de amar e ser amado; de vencer toda tibieza, fraqueza e debilidade, tendo o coração aquecido por seu amor e, consequentemente, não deixando de aquecer ninguém com igual amor. Mas sabendo do pó de que somos feitos (Gênesis 2,7) e que, por isso, não conseguiríamos por nós mesmos um novo coração e um novo espírito, ensinou-nos em seu Filho, Jesus, a esperarmos um Paráclito que, sem fazer alarde, cumpriria enfim as promessas que Deus fez, enchendo-nos de santa alegria, configurando-nos ao seu filho Jesus!
Mas não nos enganemos: não se trata de uma espera passiva. Trata-se da atividade de um coração adorador que transforma amor em solidariedade, em Reino de Deus, em vida responsorial! Responsorial, sim, pois como se de graça nós recebemos e de graça devemos dar (Mt 10,7), assim também de graça fomos amados, gratuitamente devemos amar! Ora, vindo até nós em nome do amor, Jesus nos ensinou que seu Pai é também nosso Pai e, consequentemente, somos todos irmãos. Assim, nossa santificação passa pela santificação dos nossos irmãos e irmãs. Por isso mesmo ensinou-nos a rezar: “Pai nosso que estás no céu, santificado seja o teu nome...
Nossa santificação, ou seja, o processo de tornarmo-nos santos, é obra de Deus em seu Santo Espírito enviado a nós no nome de seu Filho (Jo 14,26). Ele atua em nosso íntimo, movendo-nos para o bem, o amor e a justiça, conquistando-nos em liberdade para as obras de caridade e a edificação do Reino de Deus, para a adoração em espírito e verdade e para o pleno conhecimento d’Aquele de quem herdamos a divina filiação: Jesus Cristo.
Sem fazer alarde, o Espírito atua em nós quando em todas as situações, mas sobretudo as mais desoladoras, confirmamos uma presença amorosa que nos encoraja a não desistirmos, a nos superarmos, a não nos entregarmos a confiar sem perder a esperança e o sentido do bem que devemos fazer. Nesta certeza, cantamos: “Consolador perfeito, Hóspede doce da alma, Suave alegria, suave alegria. Na fadiga, repouso; No calor, restauro; Em todo pranto, conforto. Em todo pranto, conforto. Vem, ó Santo Espírito...”
Diácono Robson Adriano