Vivemos em todo o mundo, nossa casa comum, tempos dos mais difíceis das últimas décadas, senão dos últimos séculos, em termos de comoção, sofrimento, dores, angústias, insegurança, mas também de mobilização, solidariedade e comprometimento desde as autoridades em todas as esferas, até as pessoas, que, no anonimato, somam esforços para bloquear o vírus, que vai ceifando vidas, minando forças e causando mudanças profundas nas áreas econômicas, políticas, sociais e religiosas.
Na dimensão religiosa, o testemunho do papa Francisco, que também é chefe de Estado e oferece, além da ajuda material, o apoio espiritual, ligando a fé com a vida, onde está mais ameaçada, agredida e sofrida. Para nós cristãos católicos, a preparação para a Páscoa, na última quinzena de março e agora, na Semana Santa, sem a presença física do povo nas igrejas, mas com belíssimos testemunhos, em casa, no trabalho e, quando necessário, nas ruas servindo, doando, amando e até mesmo, a exemplo de Jesus, sacrificando a própria vida, como a do padre na Itália, que dispensou o aparelho de ajuda na respiração para favorecer um pai de família, bem mais novo do que ele. São incontáveis os exemplos registrados pela mídia e redes sociais e cada pessoa cristã, ao viver com amor sua missão, vai fazendo a Páscoa, a passagem para uma vida nova.
Temos uma especial oportunidade de celebrar os mistérios da Paixão, Morte e Ressurreição de Cristo, como jamais celebramos. Sem a confissão sacramental e a comunhão eucarística, podemos fazer uma revisão profunda de nossa vida pessoal, familiar, eclesial e social e, com humildade, reconhecer nossas faltas, pedir perdão e reconciliarmo-nos com nosso semelhante. A comunhão é feita, na acolhida e serviço prestado ao próximo e a todos. “Quem acolhe o menor por causa do meu nome é a mim que acolhe...Todas as vezes que vocês fizeram isso um desses meus irmãos mais pequeninos, foi a mim que o fizeram” (Mateus 18,5.25,40).
O “hosana” (que significa salva-me, por favor!), na aclamação a Jesus pelas ruas de Jerusalém, transforma-se no grito lancinante por cura, saúde, alimento, trabalho e dignidade. A salvação já aconteceu uma vez por todas e cabe a nós acreditar, fazer o que está ao nosso alcance, assumir mesmo a Campanha da Fraternidade 2020, no ver, sentir compaixão e cuidar, onde mais se faz necessária nossa presença em favor dos que mais precisam.
O tríduo pascal, principal celebração da Semana Santa, que começa na Quinta-Feira e termina no Sábado Santo com a Vigília, é assumido na ceia, que pode ser bem simples, mas preparada com amor, valorizando o testamento do Corpo e Sangue e o mandamento novo. Os sacerdotes e bispos estarão celebrando por todo o povo de Deus, mesmo sozinhos, ou apenas com os auxiliares e em comunhão constante para que a Páscoa seja uma passagem real para uma vida nova em todos os sentidos. Na Sexta-Feira da Paixão, a penitência e abstinência voluntária ou forçada, a adoração e beijo da cruz nas diversas manifestações de caridade e solidariedade. A via sacra, mais real e dolorosa, nos faz pensar no dia do encontro definitivo com o Senhor. O silêncio e meditação pela leitura orante da Bíblia nos prepara para a Vigília da noite mais bela do ano, quando a luz de Cristo, acesa no Círio, vem iluminar as trevas da mente e do coração. A Páscoa será plena pela acolhida e prática da Palavra, renovação sincera das promessas do Batismo e celebração eucarística, unindo as dores e os sofrimentos com o sacrifício vivo de Cristo, ontem e hoje, para sempre ressuscitado.
Pe Geraldo Barbosa