Temos diante de nós uma pauta mundial que em vista de uma pretensa sociedade plural, mais tolerante e inclusiva, flexibiliza leis e induz a comportamentos, em princípio, mais individualistas, pragmáticos e eficientistas, marginalizando valores éticos, outrora basilares para as relações humanas em sociedade.
Assim podemos compreender iniciativas como da busca pela legalização do aborto, da aprovação da eutanásia, discussões sobre ideologia de gênero, reconhecimento de várias tipificações de família e tantas outras discussões em curso.
Reconhecendo a complexidade de tais questões e as suas muitas formas de abordagem, declino-me de apresentar aqui extenso juízo de valores para cada tema, mas centralizo atenções em reafirmar princípios humanos e cristãos que devem ordenar a nossa conduta cristã e inspirar a vida em sociedade.
A vida humana é algo inviolável e, em qualquer etapa em que se encontra e em quais condições se apresenta, precisa ser respeitada, defendida e cuidada. Assim sinaliza a constituição brasileira, sobretudo no seu artigo 5º, ressaltando um princípio, de ordenamento universal, na defesa de direitos elementares que assistem a pessoa humana.
A partir das Escrituras Sagradas, Palavra de Deus para nós, e com o endosso de ciências, como em relação ao embrião humano, reafirmamos, em bases cristãs, o nosso compromisso com a vida, desde a fecundação até o seu instante último, derradeiro, de sua passagem deste mundo para a eternidade. A vida é dom de Deus; é algo sagrado. O mandamento divino é claro e incisivo “Não matarás”.
É verdade, a mãe grávida não traz uma “coisa”, um amontoado de células, dentro de si e também não é algo que faz parte de seu corpo, mas um novo ser que desde a fecundação traz inscrito todo o seu patrimônio genético e que, se não interrompido, viverá etapas de desenvolvimento, para vir a este mundo.
Por missão divina, como graça e dom, todos nós, mas a mãe, por excelência, deve proteger, cuidar e trazer essa criança ao mundo. Não se trata aqui de uma vida que mais para frente será vida humana, mas é vida humana desde o instante inicial da fecundação.
Na filosofia clássica, diríamos que esse novo ser, no útero da mãe, desde o início da gestação, é “em ato” um ser humano e “em potência” um recém-nascido, uma criança, um adolescente... e não o contrário: em ato uma vida que potencialmente será uma vida humana. Nada disso, ele não será humano no caminho da evolução, mas o é desde a sua fecundação.
Não sem grande dor, compreendemos que, em muitas situações, a mãe é também vítima, seja por ter sido estuprada, por ser adolescente/jovem diante de uma gravidez indesejada e estar agora sozinha para cuidar, por não encontrar apoio da família ou do companheiro ou mesmo por viver em grande pobreza, ter muitos filhos para criar, enfrentar riscos na gravidez... situações que causam desespero, que dificultam a acolhida desse novo ser. Às vezes falamos muito, mas agimos pouco. Temos que nos adiantar sendo mais proativos como Igreja e sociedade para ajudar essas mães em grande risco. O que temos feito, em verdade, para ajudá-las?
Assistimos no mundo a campanhas como em defesa dos “filhotes” de baleias, de tartarugas, cresce o cuidado com os “pets’... tudo isso importa e são inciativas muito justas, mas na gradação de valores e interesses, temos dado a verdadeira atenção aos “filhotes” humanos?
Num mundo de tanta violência, carente de amor, de justiça, de paz como compactuarmos com leis que agridem a vida em vez de tutelá-la? Reafirmamos a vida em primeiro lugar. Ninguém pode e nenhum motivo justifica atentar contra a vida, sobretudo de um inocente, no útero materno. Como responsabilizá-lo pelos nossos problemas?
Atentos à vida, por uma questão humana, ética e cristã, devemos lutar por leis que estejam a serviço da vida e por políticas públicas que tutelam a vida, inclusive contra o aborto social, a vida ameaçada. Ansiamos por tempos novos, de uma humanidade mais sensível à defesa da vida humana e do planeta, à dignidade humana e à promoção do bem comum. É o que também nos pede a Semana Nacional da Vida, celebrada de 1º a 7 de outubro, e o Dia do Nascituro, dia 8 de outubro.
O caminho iluminador da fé e da cidadania é o compromisso com a vida, a “mística do cuidado”, para “que todos tenham vida e vida em abundância” (Jo 10,10). Esse deve ser o nosso verdadeiro Grito pela Vida.
Pe. Marcelo Moreira Santiago
Nossa Senhora de Guadalupe, protetora dos nascituros, imploramos sua intercessão por todas as crianças em risco de aborto.