É interessante, no mínimo, a estrutura do capítulo 4 do Evangelho de Lucas. As cenas que ali se encontram são pedagogicamente apresentadas e precisamos olhar cada evento com o coração aberto para as realidades sugeridas.
O capítulo começa com as cenas desérticas, de esvaziamento e superação, onde Jesus vence as tentações que lhe são propostas sob a perspectiva da graça de Deus, deixando, a partir da Palavra viva, sem norte qualquer invectiva de maldade a Ele apresentada.
À essa sequência será somada uma outra superação, onde, após deixar-se conduzir pela força do Espírito Santo adentra ao Templo, lugar onde as referências política e religiosa estão acentuadas como domínio social e o domínio acerca da fé e ali anuncia a graça da sua missão embasada na beleza da libertação integral do ser humano, contudo, a cena posterior foi um processo de “tentação” para além do deserto (afinal outros momentos oportunos para novas tentações iriam surgir): a expulsão de Jesus da cidade e a possibilidade da morte.
O lugar dos poderes religioso e político não cabe Jesus por causa justamente da libertação e a partir dele a referência deve mudar. Ele abala esses universos devolvendo a visão aos cegos e a libertação dos presos. Jesus quer dar ao povo um olhar novo sobre as realidades da vida à luz da fé.
E o que tem a ver tudo isso com o episódio de hoje? Se percebermos bem, o templo, a sinagoga, os espaços religiosos, como se transformaram em locais de dominação, frieza, exclusão, indiferença, Jesus, transferirá a ação de Deus para fora destes lugares, as curas, a libertação dos cativos, a expulsão dos demônios que, embora sabendo quem é Jesus se recusam a segui-Lo, tudo isso torna-se símbolo de que a libertação para servir se dá a partir de Jesus e não nos lugares de dominação e de discursos limitadores da graça de Deus.
A cura da sogra de Pedro e dos demais que saem do templo estéril e vão ao encontro do Emanuel, Deus conosco, formam o novo percurso dos que querem se movimentar em direção a Deus.
A decisão missionária de Jesus faz eco ao seu itinerário pastoral ir ao encontro do povo e levar a boa nova libertadora é o desejo do Pai. Aplicar a vontade de Deus no meio da comunidade de fé e não entender essa vontade e mensagem do Pai como algo dado a um grupinho de privilegiados não cabe mais quando nos encontramos com Jesus e entendemos sua proposta.
Vencer a tentação do comodismo que não liberta e conceder o dom de Deus a todos também é missão de Jesus.
Pe. Jean Lúcio de Souza