Os discípulos começam a ter ciência sobre quem é Jesus Cristo e emitem uma nota testemunhal dizendo: “cremos que vieste da parte de Deus”.
Soa estranha a presente declaração, afinal, Jesus não precisava do testemunho humano acerca de quem Ele é. Jesus é o Filho de Deus, ungido pelo Espírito Santo. Ele é o anunciador da vontade de Deus Pai e pontífice de nossa fé. É Ele que nos encaminha para Deus. Jesus coloca nossa humanidade ao lado de Deus e atesta seu amor por nós.
Mas, por qual motivo, os discípulos se expressam daquela forma? Vamos lembrar alguns fatos no Evangelho?
Jesus se dirigia ao povo em parábolas e a compreensão daquelas realidades da fé lhes tornava inacessível. O próprio Senhor chega a declarar que se cumpria no meio do povo a profecia de Isaías – “certamente havereis de ouvir e jamais entendereis. Certamente havereis de enxergar e jamais vereis. Porque o coração deste povo se tornou insensível” (Mt 13,10-15a). Será nesta mesma passagem que Jesus garantia aos discípulos que a eles fora concedido compreender os mistérios do Reino de Deus.
Portanto, aqueles que receberam o anúncio vétero testamentário deveriam estar abertos à novidade do Evangelho em suas vidas. Fechar-se a essa realidade é impedir que a Palavra ganhe total completude no meio do povo de Deus. Os discípulos, de modo especial, estão abertos ao Evangelho, pois, tendo caminhado com Jesus, recebem, diretamente do Senhor a revelação do Reino de Deus.
A resposta de Jesus à declaração dos apóstolos é uma chamada de atenção àqueles que, de modo “privilegiado”, recebem o anúncio e as instruções sobre o Reino de Deus – credes agora? – qual o motivo de tanta lentidão? A resposta vem em seguida ao questionamento de Jesus.
O levante daquele testemunho ainda é frágil – eis que vem a hora – e já chegou – em que vos dispersareis, cada um para seu lado, e me deixareis só – é difícil crer e Jesus indica o quão frágil é a presente declaração dos discípulos e que eles irão fugir e se dispersar em vista do sacrifício, da doação de Jesus. A hora em que os discípulos não iriam pedir mais declarações e explicações sobre a fé não se daria naquele momento (disse-vos essas coisas por figuras. Chega a hora em que já não vos falarei em figuras, mas claramente vos falarei do Pai [Jo 16,25]). O exemplo da doação de Jesus na cruz, sua vitória sobre a morte e, em seguida, o envio do Espírito Santo, serão ensinamentos que o Verbo Eterno irá oferecer com sua própria vida doada.
Jesus nos ama, mas seu amor não é um amor solitário e infantilizado, seu amor é um amor enraizado na história, compromissado com o gênero humano. O Pai está com Jesus e deseja que estejamos com o Senhor para que nosso testemunho não seja frágil e fugaz, de homens e mulheres que ao se encontrarem com as dificuldades recorrentes do compromisso com o Evangelho, resmungam, murmuram e fogem.
Neste sentido o Senhor, após o testemunho frágil dos discípulos os exorta: disse-vos estas coisas para que tenhais paz em mim. No mundo, tereis tribulações. Mas, tende coragem! Eu venci o mundo! – será a partir deste testemunho que a realidade da declaração dos discípulos, para eles mesmos ganha nova configuração.
Aqueles que foram concebidos na carne, permanecem carne, mas aqueles que nascem do Espírito, pertencem ao Espírito e vivem essa realidade. Ter a paz em Jesus é deixar-se nascer daquelas realidades altíssimas e transbordar do dom de Deus. Jesus vence o mundo e age na força do Espírito e nos chama à vivência desse caminho, para que a vivência do Evangelho seja o maior testemunho dos seguidores de Jesus.
A vivência do Evangelho e seu anúncio gerará “tribulações”. Anunciá-Lo é nadar contra a maré do mundo e isso é para todos, afinal, o discípulo não é maior que o mestre. É professando e vivendo nossa fé em Jesus Cristo que venceremos as tribulações do mundo. Crendo em Jesus não seremos apóstatas da fé, mas seremos homens e mulheres corajosos no anúncio e no testemunho cristãos.
Pe. Jean Lúcio de Souza