Na leitura do profeta Jeremias, notamos que há uma movimentação que conspira cada vez mais forte contra o profeta, ligando-a a um desejo extremado de morte. Aniquilar o profeta seria semelhante a aniquilar a voz da advertência de Deus sobre seu povo. É incômodo a todos saber o que há um profeta que diz em nome do Senhor sobre a conduta desviada que assumem. Querem matar o profeta, tentando matar a profecia. Ele mesmo não se afasta da vontade de Deus e em pleno julgamento insiste sobre sua missão, continua profetizando – tratai de emendar a vossa vida e vossas obras – ao que voltam atrás em derramar sangue inocente.
Este momento na vida do profeta serve de abertura para o que se desenvolve no Evangelho de Mateus. Iniciamos o cap. 14 com aquela narrativa torva da morte de João Batista. Aqui, o profeta não foi poupado.
Mas o que Mateus deseja transmitir à comunidade?
Em um primeiro momento parece apenas que Mateus deseja informar os motivos da morte de João Batista que poderiam estar circunscritos em: a denúncia profética, o ódio de Herodíades; a covardia do Tetrarca. João denuncia o crime de Herodes que assume uma “falsa” união com a ex -mulher de seu irmão. Filipe (também conhecido como Herodes) era o irmão menos afamado de Antipas (reinante) e Herodíades era sobrinha de Antipas. Ao receber Herodíades, que opta pela riqueza e opulência da vida ao lado do Tetrarca, ele toma de seu irmão Filipe ainda com vida, conspurcando toda estrutura humana por meio de um crime aos olhos de todos, configurado em traições multilaterais. Lado outro, vendo-se ameaçada constantemente pela denúncia de João Batista a mulher de Herodes nutre o desejo de silenciar o profeta que se concretiza na festa e na dança. A morte de João se concretiza sob a égide da covardia de Herodes que “compromissado” a partir de uma tola promessa, vê-se obrigado à morte do profeta.
Contudo, há outras perspectivas que se inserem neste pequenino texto, paralelos que ligam João a Jesus. Há uma ligação inicial entre a missão de Jesus à ressurreição acreditada do Batista que já sinaliza essa dimensão. Neste momento parece que o evangelista tem o desejo de instruir a comunidade sobre esta ligação entre ambos – aquele que vem depois de mim é mais forte do que eu (Mt 3,11) – e isto, torna-se simbólico, porque ao mesmo tempo, a morte de ambos sinaliza o mesmo destino (ressurreição). A rejeição de João e a rejeição de Jesus são similares, como vimos no dia de ontem. A rejeição de Jesus chegará a atingir níveis de exclusão. Ambos considerados profetas pelo povo. Suas prisões serão por fatos insignificantes, mas que se ligam à covardia e ódio acerca da missão. O mesmo fim trágico de João será atribuído a Jesus, contudo, o fim trágico que espera Jesus é o fim do “Cordeiro que tira o pecado”, o Cordeiro imolado anunciado e apresentado por João Batista à comunidade, o mais forte se sacrifica por todos, no lugar de todos, para a salvação de todos.
Pe. Jean Lúcio de Souza