Caros irmãos e irmãs,
É interessante a dinâmica do texto do Evangelho de hoje. Há um desenvolvimento nascido, para variar, de uma contenda, de uma crítica que nasce do estranhamento de alguns fariseus e mestres da lei que se reuniram com Jesus. O motivo daquela reunião, pouco ou nada sabemos, sabemos apenas que vieram atrás de Jesus, se para aprender, se para observar, se para buscar motivos para incriminá-lo, não podemos fazer muita conta.
O que temos é a sequência deste encontro, o grupo visitante, quando observa os discípulos de Jesus, percebe que eles não seguem um dos tantos “tradicismos” criado pela religião que seguiam, eles não lavavam as mãos, como deveriam ser lavadas, aos moldes religiosos, antes de se alimentar. Pronto! Aí virou uma confusão!
Marcos nos fala que fariseus e os judeus, naquele tempo, seguiam vários costumes recebidos dos antigos, coisas de gente como a gente, que gosta de “inventar modas” e transformar tradições/costumes mais importantes que a realidade profunda da fé que se professa. Alguns atos de higiene são transformados em “lei” e cada ato possuía seu modo certo de ser executado, segundo a “lei” para que as pessoas e as coisas se tornassem puras. Como se lavar os copos fosse mais importante que ter um coração voltado para Deus.
Neste sentido, após a demandada crítica cheia de julgamentos, Jesus responde, não como queriam, tendo a submissão de Jesus frente aos tradicismos, mas mostrando a verdadeira realidade que nasce da identificação do povo com Jesus e sua missão. Os discípulos se identificam com o Senhor e não com “coisas inventadas”.
De que adianta as mãos limpas, os copos limpos, as vasilhas limpas se o coração está tomado por todo tipo de indisposição humana? Criamos costumes que se transformam em “lei”, costumes que se transformam em correntes, limites, linhas de distanciamento do outro. Esses costumes criam o “ensimesmamento” que surge de uma falsa ou limitada compreensão do que é fé. Somos capazes de viajar quilômetros buscando milagres, ir ao encontro de realidades eclesiais em outras cidades e até mesmo estados, mas não temos coragem de transformar a vida local em um milagre a partir de nosso encontro com o outro que está à margem. Não somamos às realidades de nossas comunidades de origem, mas julgamos outras realidades mais notórias, quem sabe por causa de vestes, do latim, do brilho, mas aquelas realidades mais simples das comunidades ribeirinhas e mais distantes não são atraentes.
Louvamos bem. Cantamos bem. Colocamos as mãos sobre o peito e cantamos louvores incontestavelmente lindos, mas... “estive preso e foste me visitar”... pode ser deixado para depois. Ou “tive fome e me destes de comer”, a prefeitura pode fazer isso. Não somos mais bem-aventurados por não sabermos ou por não conseguirmos nos afligir com as realidades sociais que nos distanciam da vida em abundância para todos que o Senhor deseja. Falamos a língua dos anjos, mas a língua da misericórdia e do amor à medida do amor de Jesus, não aprendemos .
Lado outro, podemos ser ativos demais nas realidades sociais e transformadoras, mas esquecemos que precisamos subir ao monte para orar em silêncio com Jesus. Conseguimos discursar em tribunas, palanques, falamos com propriedade sobre as realidades sociais que urgem nosso compromisso com o outro, e isso é justo e verdadeiro, mas não conseguimos mais compreender que essa realidade tem que nascer do Evangelho e não do meu partido ideológico. Podemos querer a todo custo transformar a sociedade por meio de uma atuação política vigorosa, mas se essa atuação política não vier de uma reta audiência da Palavra de Deus que nos manda "avançar para águas mais profundas”, poderemos estar buscando o populismo e aí, pronto! Não vai dar certo! Jesus não quis ser proclamado rei. Jesus quis ser lavador de pés.
O real desejo nasce do simples: honrar pai e mãe, ali dentro de casa é uma demonstração de que lugar ocupamos na realidade da fé. Se os honramos, verdadeiramente, isso significa que falamos a linguagem do amor e promovemos a justiça social em nossas casas, cada um em seu lugar, cada um recebendo a atenção segundo seu estado de vida e sua temporalidade. Um dia nossos pais ouviram – dai-lhes vós mesmos de comer – e nos alimentaram enquanto seus pequeninos, hoje pode ser nós mesmos ouvindo de Deus – dai-lhes vós mesmos de comer – o alimento do respeito, do carinho, do diálogo que às vezes negamos em casa...
Jesus sabiamente usa a ideia do corban, um sacrifício devotado a Deus, contudo que se aplica à própria vida do fiel. Por isso, lá em Oséias (6,6) vamos encontrar o profeta dizendo: pois eu quero amor e não sacrifícios, conhecimento de Deus mais que holocaustos, ou seja, não inventem modas para suas vidas, apenas aprendam a amar as realidades que estão à sua volta, sejam misericordiosos começando em casa, sacrifiquem não o jeito de lavar mãos e copos, mas ofereçam a Deus o propósito de um encontro fecundo com o Senhor nna ação justa e na espiritualidade que gere uma responsabilidade com vida integral.
Embora Maria tenha escolhido a melhor parte, ou seja, ouvir o que Jesus tinha a dizer enquanto Marta estava muito ocupada em seus afazeres, incluindo a impossibilidade, enquanto mulher, de participar dos colóquios de Jesus, seguindo uma tradição/costume de seu tempo, de nada adiantaria ouvir Jesus e não seguir confiando e transformando o ouvir em fé viva. Portanto, acredito que seria bom ter ouvidos de Maria, mas uma pitadinha da coragem de Marta em agir, servir, também seria bom.
Coragem!
Deus é bom e Ele cuida de nós!
Pe. Jean Lúcio de Souza
Hoje, cebramos a memória de Nossa Senhora de Lourdes. Rezemos por todos os enfermos, todos os profissionais da saúde e todos os que se dedicam a cuidar dos doentes.
Nossa Senhora de Lourdes, rogai por nós!