O profeta Daniel clama ao Senhor em favor do povo. Clama ao povo (que também somos nós) dizendo-lhe que apenas cabe-lhe ter, em bom português, “vergonha na cara”! O profeta confia no Senhor e em sua Misericórdia, para que ela chegue junto com o julgamento do Eterno para que não venhamos a perecer.
O Salmista também suplica e sua súplica é de tal modo confiante que antes do pedido de socorro ele crê na misericórdia de Deus e pede ao Senhor que a misericórdia antecipe o socorro, porque sem a misericórdia o perecimento do povo seria total.
Portanto, a misericórdia é o “jeito de agir” de Deus. Deus age na misericórdia que pulsa em seu amor e é por esse motivo que não nos trata como exigem nossas faltas, lembrando São João Paulo II, a misericórdia é a especial potência do amor que prevalece sobre o pecado, mas com o Cristo a misericórdia, amor encarnado, é mais profunda, ela resgata o gênero humano intensamente.
Quando o Verbo de Deus se fez carne e torna-se presença viva e continua no meio de nós, a misericórdia ganha novo jeito de ser de tal forma que sua mensagem é igualmente mensagem de misericórdia. O Papa Francisco assim nos ensina: o Evangelho é o livro da misericórdia de Deus, que havemos de ler e reler, porque tudo o que Jesus disse e fez é expressão da misericórdia do Pai. Se a misericórdia é o jeito de Deus agir no mundo, o jeito encarnado de Deus agir no mundo pela misericórdia é Jesus.
Ainda nos fala o Papa Francisco sobre a misericórdia:
Repassando as páginas da Sagrada Escritura, vemos que a misericórdia é, antes de mais nada, a proximidade de Deus ao seu povo. Uma proximidade que se exprime e manifesta principalmente como ajuda e proteção. É a proximidade dum pai e duma mãe que se espelha numa bela imagem do profeta Oseias. Diz assim: «Segurava-os com laços humanos, com laços de amor, fui para ele como os que levantam uma criancinha contra o seu rosto; inclinei-me para ele, para lhe dar de comer» (11, 4). O abraço dum pai e duma mãe ao seu filho. É muito expressiva esta imagem: Deus pega em cada um de nós e levanta-nos até ao seu rosto. Quanta ternura contém e quanto amor manifesta!
Jesus insiste neste caminho para a Comunidade dos fiéis. O exercício da misericórdia é o exercício perfeito daqueles que foram alcançados pela misericórdia de um Pai que não nos pune ao rigor segundo nossas faltas e pecados, mas aguarda-nos sempre de braços abertos na esperança da conversão.
Contudo, creio, que há algo que o Pai não tolera: a ausência da misericórdia. Ora, se fomos alcançados pelo amor de Deus manifestado na Misericórdia encarnada e crucificada, esse mesmo Pai e Deus que ouve nossos rogos e pedidos de perdão e que verdadeiramente não nos pune com o açoite do feitor, tanto mais, nós devemos nos colocar em ordem de misericórdia com relação aos irmãos e irmãs.
O texto do Evangelho de hoje é curto, mas denso. Uma ordem subliminar: sejamos misericordiosos como o Pai é Misericordioso e nos acolhe e não nos pune. Sejamos misericordiosos no olhar, no falar, primando pelo silêncio cheio de obséquio em favor do outro, sejamos misericordiosos em nossas condutas de resgate, acolhimento e libertação no amor, porque se nos escusamos do ofício da misericordiosa caridade significará que temos mais tempo para julgar e condenar que amar, assim, uma boa medida, calcada, sacudida, transbordante será colocada em nosso colo; porque com a mesma medida com que medirmos os outros, nós também seremos medidos.
Atenção: que nossa medida seja a do amor, da misericórdia!
Pe. Jean Lúcio de Souza