Sempre que este pequenino texto de Lucas é proclamado, sinto-me um observador da gentileza que a graça de Deus nos comunica e toca nossas vidas em Jesus Cristo.
O enredo que se movimenta é provocativo, as cenas são intensas: a cena do oficial e o enfermo, a cena dos anciãos com Jesus e a cena da profissão de fé. O Eterno toca cada movimento desses na esperança e os preenche na graça. Que há de gentil em todo esse espaço?
A resposta é simples, a gentileza está no ato de ouvir. Jesus ouve e ouvindo, cura!
Ouvir é um ato de gentileza que anda meio esquecido entre nós. Somos muito rápidos para falar. Falamos de modo variado e muitas vezes sem pensar sobre o que estamos falando, e o mais trágico, com quem estamos conversando e sobre o que pretendemos comunicar.
Rubem Alves gostava de dizer que estamos tão habituados a falar que criamos até os cursos de oratória, mas não temos cursos de “escutatória”, ou seja, um curso que nos ensinasse a arte sutil do ouvir.
Hoje, de modo muito especial Jesus ouve com atenção:
_ “o oficial merece”!
_ “eu não sou digno”!
Após o pedido dos anciãos há uma ação, Jesus se coloca a caminho, silencioso. Pensemos, durante o caminho, o que Jesus está escutando daqueles anciãos? O que pensa Jesus? Será que os anciãos se julgam “muito dignos”? Jesus ouve, mas a eles nada é dito. Ele apenas ouve.
Num determinado momento, no meio do caminho, ecoa-se a bela profissão de fé do oficial e ela ecoa até hoje em nossas missas – “eu não sou digno de que Tu entres em minha casa, diz apenas uma palavra, eu creio nessa palavra, eu sei que tudo podes...” – à essa declaração a resposta de Jesus é imediata (o silêncio é quebrado), logo, o empregado é curado, mas também Jesus respeita o pedido do oficial e não vai ao seu encontro, não entra em sua “casa”.
Jesus entende que o oficial é indigno e aceita isso? Acredito piamente que não, ao contrário, a dignidade está também na confiança. O oficial confia em Jesus e Nele espera e, por isso, Jesus declara, de modo solene, que foi preciso que um pagão, um não crente, um homem que não professa a fé aos moldes do povo de Israel, exclamasse com tanto fervor que acreditava e esperava.
Ah quão bela essa cena! Deus é gentil com todos! Na casa do Pai todos são filhos amados, todos são queridos dentro da assembleia, dentro da “Kefa”.
Jesus ao ouvir o oficial entende que sua fé está embasada na realidade de uma vida de quem não apenas crê mas, de quem crê, confia e espera.
Jesus quebra os padrões e elogia um “pagão”. Jesus não desliga ninguém, Ele liga todos a Ele, não importando sua religião, sua igreja, seu jeito de ser e viver, desde que sejamos sinceros em nosso encontro com Jesus, desde que o reconheçamos em nossa história como verdadeiro Filho do Deus vivo.
A gentileza de Deus nos alcança a todos e nos coloca perto de Si, num abraço para além do toque físico. Ele rouba para Si nossos corações e nos sentimos gratos por esse acolhimento... Ah Deus de amor, tão gentil com todos, cura-nos ouvindo-nos, transforma-nos, curando nossas mazelas. Também somos Vosso povo.
Pe. Jean Lúcio de Souza