Caros irmãos e irmãs,
Vemos nos textos de hoje um dado muito importante sobre a missão de Jesus que não se dá apartada das realidades humanas, pelo contrário, Ele a vive no meio de nós, lado outro, descobrimos que viver a missão de Jesus (em nós) é viver com Ele no meio do povo e vendo-O agir, descobrimos que estamos profundamente ligados a Ele. Ainda estamos assentados no chão deste mundo com nossas histórias exclusivas e peculiares e enquanto estivermos por aqui como peregrinos, seremos seus discípulos.
Lucas, a partir do texto de Isaías, demonstra a missão de Jesus fixada no agir através de quatro verbos: anunciar, proclamar, recuperar e libertar. Poderíamos entender que anunciar e proclamar possuem o mesmo sentido, devido à sua raiz comunicativa, mas ao que parece, possuem sentidos diferentes.
O verbo anunciar, estaria mais ligado à dimensão do “ensino”, da comunicação “intima”, profunda, enraizada à comunicação catequética que instrui a vida e sobre a vida. O verbo proclamar se dá em uma dimensão mais “ampla”, no lugar da alta voz, não teria o objetivo de ensinar, mas de denunciar, provocar, estimular, fazer algo ou levar a agir, promovendo uma transformação do íntimo de si para o interior da comunidade.
Assim, quando vemos Jesus com os discípulos no ato de ensinar, quando vemos Jesus indo indo à casa de Mateus, quando percebemos Jesus na intimidade das bodas de Caná, nos seus encontros com João Batista e Nicodemos, o encontro com as crianças as curas íntimas, os momentos na sinagoga, e o ensinamento que aprendemos no domingo passado, dentre tantos outros, percebemos o anunciar a boa nova aos pobres ligado à bem-aventurança...
Lado outro quando encontramos Jesus em situações mais drásticas como estabelecer uma crítica às estruturas de poder reinantes em sua época, como ocorre com a expulsão dos vendilhões do tempo, a crítica aos fariseus “chamando-os de raposas”, dizendo que gostavam de colocar pesados fardos sobre os outros, a crítica ao contraste entre a oferta dos ricos e a oferta da viúva, o vemos proclamando, provocando a comunidade. O conforto e a fé light nunca foram os objetivos de Jesus.
Quem não se lembra das curas dos cegos e do pedido a um deles que não regressasse à cidade, quem desconhece as tantas libertações através das mãos estendidas aos menos favorecidos, à prostituta e o pedido de não pecar mais, isto é, de não se envolver com tudo aquilo que a afastasse de sua dignidade. Tudo isso amplia nossa compreensão onde somos chamados a perceber como a ação de Jesus não se dá no isolamento, sua missão está atrelada aos encontros profundos com o gênero humano, tocar a vida de cada um e de toda a comunidade ao mesmo tempo.
Todas as ações que se ligam à ação do Cristo no Evangelho são ações que também nos ligam à missão do Senhor. Batizados e unidos ao corpo místico de Cristo devemos, no contato humano, anunciar, proclamar, curar e libertar.
Nossa fé cristã não deve ser estéril, mas ao contrário, deve ser fecunda, partilhada com o Senhor. Com Ele e Nele somos homens e mulheres ungidos na graça do Espírito Santo. Já pensamos nisso? O Cristo não nos repele, mas nos escolhe para “irmos” em missão.
Devemos anunciar com alegria, ensinar e comunicar a partir de nossa intimidade humilde e silenciosa com o Senhor. Será nesta intimidade profunda, enraizada no coração de Jesus que aprenderemos e exerceremos nosso ministério catequético fazendo ecoar no mundo a beleza doEevangelho e transformaremos a vida humana em nós naqueles que desejam viver com Cristo. Também seremos proclamadores na amplitude da fé que professamos. Em voz alta somos chamados a denunciar as injustiças e a maldade que impera no mundo e assim construímos um novo céu e uma nova terra. Nossa ação de semear e fazer frutificar no mundo é também uma ação profética com o Senhor no seio da comunidade.
Podemos até não curar “fisicamente” os irmãos e irmãs, mas podemos colaborar na cura dos corações, das consciências feridas, podemos colaborar na cura da solidão, do medo, podemos ajudar a curar a falta de possibilidades na vida, curar as injustiças promovidas no chão deste mundo, aí descobrimos nossa vocação de “libertar” os cativos.
Cada um de nós e todos juntos, enquanto comunidade eclesial, cantando a ação de graças e suplicando a misericórdia de Deus nosso Pai, vivendo a missão do Senhor, mas sempre com o Senhor, podemos nos tornar em homens e mulheres peregrinos no discipulado, edificadores do Reino de Deus e cooperadores do bem e do amor.
Coragem!
Pe. Jean Lúcio de Souza